Gestão em Saúde

Por: Moises Warszawiak

Economia e Custos em Sáude

A evolução dos sistemas de saúde em todo o mundo está levando-os a um mesmo ponto: a necessidade de contenção (e se possível, redução) dos gastos com a assistência médica – hospitalar. Assim, parece haver uma convergência natural para a adoção de mecanismos relacionados ao gerenciamento, que produzam maior eficiência e eficácia nesses sistemas atuando ao nível da microeconomia, tais como : pagamento aos prestadores através da capitação, controle da utilização, co-responsabilização de prestadores e usuários.

A crescente competição de custos no sistema de saúde, tem dado margem à pressões, para melhorar a eficiência da produção de serviços de saúde. Economias a partir de junção de várias funções de negócio na prática médica, têm sido consistentemente demonstradas. O custo para manter um sistema de assistência à saúde vem aumentando devido ao crescente investimento em tecnologia e sistemas de informações caros, seguro de “má”prática e custos de outros materiais médicos.

Alguns custos em elevação têm sido associados com a própria indústria de atendimento gerenciado, tais como cobranças, processos reclamatórios e procedimentos de auditoria.Quando as forças competitivas requerem, tanto às operadoras de planos de saúde como a rede prestadora de serviços de saúde, têm respondido unindo práticas administrativas para obter economias de escala e maior acesso a capital.

ECONOMIA EM SAÚDE

A economia tem um convívio muito difícil com as profissões na área da saúde. São raros os economistas que se interessam e permanecem interessados nesse setor; em contrapartida, poucos profissionais da saúde atuam na área econômica, consideram-na muito abstrata, teórica ou escassa de instrumentos de intervenção direta, no local e momento, requeridos pelo pessoal da saúde.Por outro lado, os “economistas puros” necessitam de esforços para entender a área da assistência à saúde. Os serviços de saúde não são apenas organizações distribuidoras de bens e serviços. Assistência à saúde significa, também, auxiliar os seres humanos a ultrapassar dificuldades e inconvenientes da vida, o que é quase impossível de traduzir em números.Economia e saúde estão interligadas de várias formas, o seu estudo, a pesquisa sistemática e a aplicação de instrumentos econômicos à questões tanto estratégicas como operacionais do setor saúde, deram origem à Economia da Saúde.

PRIVATIZAÇÃO DO SETOR SAÚDE NO BRASIL

Muitos países, incluindo-se o Brasil, têm em suas Constituições, a saúde como um direito do cidadão. A falta de consenso inicia-se pela expectativa de se alcançar a saúde sem a participação efetiva do indivíduo, de seus hábitos e de seu modo de vida, como se a saúde fosse um bem disponível, independentemente das ações do indivíduo em obtê-las. Tendo em vista recursos orçamentários limitados, a discussão chega à questão das prioridades da aplicação de recursos.No Brasil, assim como em outros países com uma economia semelhante, o mosaico de serviços de saúde que a população encontra está distorcido por uma série de razões :
  • os serviços de saúde não correspondem às necessidades da população;
  • a distribuição geográfica dos recursos é extremamente desigual;
  • em algumas áreas existe uso excessivo de alta tecnologia para tratar os efeitos de moléstias preveníveis;
  • há uso excessivo e venda liberal de medicamentos;
  • há internações desnecessárias, referências a outros níveis e exames supérfluos;
  • há excessivo uso e competitividade por exames auxiliares lucrativos e cirurgias eletivas;
  • distribuição dos recursos sem mecanismos apropriados de controle; entre outros fatores.

Como conseqüência, os custos dos serviços de saúde estão fora de controle, sendo difícil medir seus benefícios, mesmo a partir de programas específicos. Os incentivos dimensionam-se à especialização: o governo premia procedimentos de alto custo com programas especiais e remuneração diferenciada. As indústrias farmacêuticas e de equipamentos médico – hospitalares seguem essa mesma tendência, também estimulando o desenvolvimento de especialistas, tendência aliás, verificada na própria grade curricular das escolas médicas.As estimativas oficiais apontam de que 95% da população brasileira tem cobertura de serviços de saúde (Del Nero, 1995). Na prática, estima-se que 30% da população não tem acesso a qualquer tipo de serviço de saúde. São os habitantes da periferia das grandes cidades e a população de áreas remotas. Planejamento e controle insuficientes tornam o Sistema Único de Saúde burocrático e ineficaz. A partir da década de 60, são repassadas responsabilidades da assistência médica-hospitalar, que antes era do Estado, também para as Empresas, iniciando assim, a evolução histórica da terceirização no setor saúde.Existem , portanto, ao invés de um Sistema Único de Saúde no Brasil, dois Subsistemas de Saúde: o Público e o Privado.No Brasil existem 56 milhões de vidas cobertas pela medicina privada nas quatro modalidades relacionadas no quadro abaixo, sendo que 75% deste total, têm cobertura de Planos de Saúde Empresariais :

M O D A L I D A D E

1992

1997

2000

Medicina de Grupo

15,8

17,3

25,2

Autogestão

5,1

10,0

11,0

Cooperativas

9,0

9,0

14,7

Seguradoras

2,5

6,0

5,5

T O T A L

32,4

42,3

56,4

Fontes: ABRAMGE-1998/ABRASPE-2000Estima-se que 7 a 10 milhões de pessoas, sejam absorvidas por esse mercado, nos próximos cinco anos.

CUSTOS COM BENEFÍCIO SAÚDE

A assistência médica, entendida como a área que realiza ações e presta serviços ambulatoriais, hospitalares, preventivos e educativos, possuindo características únicas, totalmente distintas das existentes nos demais processos produtivos. Suas peculiaridades porém, exigem que seja realizada uma medição criteriosa. Na falta desta, a utilização de métodos de controle e aferição de custos, comuns às demais atividades produtivas pode ser simplesmente infrutífera, podendo obter-se, por exemplo, uma diminuição no custo, com um incremento da doença. Partindo dessa premissa, julga-se ser importante estudar a Implantação de um Sistema de Custos que permita quantificar os valores das atividades envolvidas na prestação de serviços médico assistenciais, bem como avaliar sua eficiência e eficácia. A tendência ascendente dos custos em saúde, é mundial.O benefício saúde é a segunda maior despesa nas grandes empresas brasileiras, representando entre 7% a 9% do total da folha de pagamento, sendo menor somente do que a despesa com salários.Mundialmente, o setor saúde apresenta uma tendência de inflação setorial. No Brasil, tivemos uma variação na área de saúde de 20% no período de janeiro de 1997 a agosto de 2000, contra uma variação de apenas 14% no índice geral de preços, no mesmo período, medido pela FIPE. Ou seja, a saúde teve um aumento de 42,85% a mais que o índice geral de preços no período referido.A grande maioria das empresas brasileiras está revisando gradualmente a concessão deste benefício, preparando-se para alternativas que atendam à necessidade de reduzir custos , garantindo qualidade na assistência à saúde.

CONTROLE DO CUSTO COM SAÚDE

Controlar o custo crescente da assistência médica é hoje, mundialmente, a questão central, qualquer que seja o país considerado ou a modalidade assistencial praticada. Para tanto, devemos ter claro alguns conceitos e definições para melhor entendimento do assunto:
  • Custo de Oportunidade : é o custo que representa utilizar um recurso em seu melhor uso. É expresso também como o benefício obtido, ao comprometer os recursos em um determinado programa ou serviço de saúde.
  • Análise Custo-Benefício (ACB) : método de avaliação econômica que tem por objetivo identificar, medir e valorizar os custos e benefícios sociais de determinadas ações; a ACB procura avaliar, sistematicamente, todos os custos e resultados associados a alternativas diferentes, para determinar qual alternativa maximiza a diferença ou a razão entre benefícios e custos. A ACB distingue-se dos outros métodos de avaliação econômica por valorizar tanto os custos como os resultados em termos monetários.
  • Análise Custo-Efetividade (ACE): método de avaliação econômica teoricamente menos ambiciosa do que o ACB. Distingue-se desta última pelo fato de os resultados ou conseqüências dos programas e serviços de saúde serem medidos em unidades físicas ( por exemplo, anos de vida ganhos ou casos detectados). O método ACE justifica-se quando os benefícios são dificilmente monetarezáveis. Regra geral, procura responder a dois tipos de pergunta: que programa é capaz de realizar objetivos pré fixados ao menor custo possível ( por exemplo, o custo mais baixo por vida salva); ou, alternativamente, que tipo de atividade permite maximizar os benefícios de uma dada verba ? Em cada caso, fixa-se um dos parâmetros, avaliando-se, respectivamente, qual dos programas maximiza os benefícios ou minimiza os custos.
Entre inúmeras razões, destacamos três as vertentes interrelacionadas que influenciam no custo crescente com a saúde:
  • Aumento da expectativa de vida da população;
  • Avanços tecnológicos no campo do diagnóstico e tratamento: doenças antes incuráveis ou fatais passam a ter cura ou são passíveis de tratamentos que prolongam a vida;
  • Aspirações da população e facilidades de acesso.
As primeiras tentativas de conter os custos crescentes da assistência médica envolve ação sobre o consumo dos serviços, quais sejam :
  • restrição ao acesso;
  • criação de fatores moderadores de co-participação no custeio;
  • exclusão do atendimento de algumas patologias como doenças pré-existentes, infecto-contagiosas e outras;
  • exclusão do atendimento de procedimentos que implicam em novas tecnologias enquanto se desconhece seu impacto no custo: transplantes de órgãos, videolaparoscopias, ultrassom, escleroterapia e outros.
As mudanças nas práticas médicas e nas demais ações de saúde, refletem a tendência mundial de redução da hospitalização para tratamento médico e ênfase no médico de família, na triagem e no tratamento ambulatorial, tais como :
  • PRIMARY CARE PHYSICIAN (PCP) – medicina geral, médico de família (triagens).
  • HOME CARE (HC) – tratamento domiciliar, com suporte de profissionais especializados, em pacientes com patologias que geram longos períodos de internamentos. Pacientes crônicos e/ou idosos.
  • DAY HOSPITAL (DH) – manutenção do paciente no hospital por período inferior a 12 horas, em tratamentos cirúrgicos de menor porte, a preço menor do que o de uma internação, sem perda de qualidade e com menor risco de infeção hospitalar.
  • CASE MANAGEMENT – monitoramento de casos e ação sobre estes antes de agudização.
  • MÉDICO VIRTUAL – utilização de recursos da informática e robótica para monitorização de tratamento de pacientes sem a presença do especialista.
  • GATE KEEPER – adoção de portas de entrada ao sistema de saúde, estabelecendo melhores parcerias e rede preferencial de assistência.
  • MANAGED CARE – gestão de gastos em saúde, baseada em sistemas de informações gerenciais, que através da adoção de múltiplas ferramentas técnico-gerenciais, busca promover e estimular práticas médicas resolutivas, que evitem o desperdício dos recursos disponíveis mantendo o compromisso com a qualidade de vida da população assistida. Esta forma de gerenciamento se propõe : atender as necessidades e desejos dos pacientes (“market-oriented”), modificar o comportamento do médico, garantir sucesso financeiro às empresas, influenciar comportamento do paciente, reduzir riscos através de protocolos clínicos baseado em evidências.
Diversos Sistemas e/ou Modelos de Atenção à Saúde foram criados ao longo do tempo, adotando técnicas para gerenciamento do custo-saúde, fundamentada na utilização dirigida, restrita e controlada dos serviços de saúde assistenciais, com responsabilidades compartilhadas de custeio, envolvendo o associado, o provedor e o prestador de saúde, tais como :
  • HEALTH MAINTENANCE ORGANIZATION (HMO) – modelo de medicinas de grupo americanas, implantado na década de 30 e regulamentada na década de 70. Estabelece critérios-padrões de atendimento por tipo de doença.
  • PREFERRED PROVIDER ORGANIZATION (PPO) – modelo americano que utiliza redes provedoras regionais e negocia novas formas de remuneração médica, que compartilham riscos e adotam protocolos restritos ao consumo indevido de serviço de saúde.
  • CAPITAÇÃO – substituição do pagamento por procedimento por um valor “per cápita” por beneficiário, repassado ao prestador, que passa a “administrar a saúde” deste beneficiário . Esta forma de pagamento é usada nas HMO´s/EUA e nas NHS/Inglaterra;
  • TABELA DE PAGAMENTO DE CUSTO-PADRÃO POR DIAGNÓSTICO- usado pelo Medicare/EUA desde 1983 e as AIH´s (autorização de internamento hospitalar) desde 1981 pelo então INAMPS/Brasil e hoje ainda usado pelo SUS/Brasil.
  • ORÇAMENTO GLOBAL – orçamento fixo para cada estabelecimento de saúde, deixando que a administração do estabelecimento/rede de serviços defina os meios para garantir a cobertura. Esta modalidade de pagamento é usada pelo Sistema Nacional de Saúde da Inglaterra.
  • CONTRATOS DE GESTÃO - estabelecimento de contrato de gestão com hospitais que passam a ter compromisso com metas de produtividade relacionadas com repasse de recursos e flexibilidade administrativa, modelo este, praticado nos Hospitais Públicos da França.
As necessidades básicas para a modernização dos Planos de Saúde incorporam ferramentas que permitam controlar custos, garantindo a resolutividade das ações de saúde. Um Programa de Gerenciamento de Custos, exige além de estudos epidemiológicos :
  • Um sistema de informações gerenciais estruturado em dados com base histórica e em relatórios ágeis que reflitam a evolução do comportamento dos usuários e dos provedores de serviços;
  • estudos para redefinição da arquitetura de seu convênio, tendo como base as tendências mundiais de evolução do custo saúde;
  • padronização dos instrumentos de coleta de informações;
  • buscar a criação e a operação de Câmaras de Compensação de Contas Médicas informatizada;
  • implantação de medidas de auditoria, controle, avaliação e permissionamento de procedimentos médicos, em tempo real dos acontecimentos;
  • promoção de medidas preventivas e educativas, tais como criação de grupos específicos de : diabéticos, hipertensos, obesos, fumantes e outros;
  • gerenciamento da “ cesta de benefícios” oferecida pelo Plano, co-responsabilizando financeiramente o usuário na utilização de ações e serviços de saúde;
  • gerenciamento da prescrição do médico – o encontro clínico entre médico e paciente, o processo clínico, o sistema integrado de saúde – co-responsabilizando financeiramente o médico e os demais prestadores na utilização de ações e serviços.

NOVOS PRINCÍPIOS DE AÇÃO NA GESTÃO DE CUSTOS

O atual cenário econômico relativo a gestão em saúde, nos leva a pensar em novos princípios de atuação que conciliem interesses da classe dos prestadores de serviços de saúde, dos serviços de saúde e dos planos de saúde, introduzindo o compartilhamento de riscos e o acompanhamento de custos, visando oferecer uma assistência à saúde com qualidade, resolutividade, eficiente e eficaz. Para tanto é necessário que ocorram mudanças na atual prática de gestão em saúde, conforme proposto no quadro abaixo :

P R Á T I C A S A T U A I S

N O V O S P R I N C Í P I O S

  • Tratamento de doenças
  • Cura dos doentes (resolutividade)
  • Busca dos menores preços
  • Medidas custo-eficientes
  • Ação administrativa visando o pagamento (ou a glosa) dos serviços prestados
  • Ações gerenciais utilizando indicadores macroeconômicos
  • Redes externas (marketing) que mantém relacionamento exclusivo de compra e venda de serviços
  • Redes selecionadas com compromissos em relação à qualidade do atendimento e criatividade nas formas de remuneração
  • Serviços exclusivamente assistenciais com foco no hospital
  • Ações de promoção e educação em saúde. Programas de qualidade de vida
  • Autonomia do médico
  • Interdependência do médico
  • Foco nas especialidades
  • Foco no associado e seu vínculo com o médico de família